quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Mulher ao espelho







Hoje que seja esta ou aquela, 
pouco me importa. 
Quero apenas parecer bela, 
pois, seja qual for, estou morta. 

Já fui loura, já fui morena, 
já fui Margarida e Beatriz. 
Já fui Maria e Madalena. 
Só não pude ser como quis. 

Que mal faz, esta cor fingida 
do meu cabelo, e do meu rosto, 
se tudo é tinta: o mundo, a vida, 
o contentamento, o desgosto? 

Por fora, serei como queira 
a moda, que me vai matando. 
Que me levem pele e caveira 
ao nada, não me importa quando. 

Mas quem viu, tão dilacerados, 
olhos, braços e sonhos seu 
se morreu pelos seus pecados, 
falará com Deus. 

Falará, coberta de luzes, 
do alto penteado ao rubro artelho. 
Porque uns expiram sobre cruzes, 
outros, buscando-se no espelho.




Cecília Meireles

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